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Usucapião extrajudicial: breve comentário

Johnny Matheus Oliveira Rodrigues
Auxiliar do Setor de Registro do Oficio do 2º Registro de Imóveis de Montes Claros

Com a modificação da Lei 6.015/73, pela Lei 13.105/2015, que acrescentou o art. 216-A à Lei de Registros Públicos, autorizando reconhecimento da usucapião sem necessidade de processo judicial, o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), por meio do Provimento 65/2017, datado de 14/12/2017, estabeleceu diretrizes importantes para o procedimento extrajudicial da usucapião.

Diante da credibilidade e à luz do princípio da segurança jurídica ofertada pelos tabeliões e registradores, o cidadão pode ter o registro de um bem imóvel em seu nome, sobre o qual já possui a posse, o uso e o gozo, de forma rápida e segura. A palavra usucapião, inclusive, surge do latim usucapio, que significa adquirir pelo uso.

Mas para que o cidadão tenha a usucapião reconhecida, deve preencher os requisitos estabelecidos pela lei, em regra geral, a saber:

  • Ter a posse com intenção de dono (animus domini);
  • Manter a posse mansa e pacífica, sem enfrentar a oposição do proprietário do bem;
  • Ser contínua e duradoura, possuindo a terra por um determinado lapso temporal, conforme cada caso;
  • Ser justa, sem decorrer de violência ou de forma clandestina;
  • O bem usucapido não pode ser público.

Em resumo, a usucapião é o direito que o indivíduo adquire em relação à posse que exerce, seja de um bem móvel ou imóvel, decorrente da utilização por um determinado tempo, de forma contínua e incontestada. Dessa forma, o possuidor adquire o direito sobre a propriedade livre de quaisquer ônus ou imperfeições, mesmo que existam ações ou ônus lançados na matrícula, pois a nova propriedade adquirida pelo título de usucapião não se deriva da anterior.

O interessado deverá consultar a legislação para verificar o enquadramento do seu tipo de posse, que determinará qual espécie de usucapião deverá requerer e o tempo necessário:

  • 15 anos (extraordinária): posse ininterrupta e sem oposição, independentemente de justo título e boa-fé. Prevista no art. 1.238 do Código Civil.
  • 10 anos (extraordinária habitacional ou pro labore): posse ininterrupta e sem oposição para fins de moradia habitual ou que tenha o possuidor realizado obras ou serviços de caráter produtivo, independentemente de justo título e boa-fé. Prevista no art.1.238, parágrafo único, do Código Civil.
  • 10 anos (ordinária): posse ininterrupta e sem oposição, com justo título e boa-fé. Prevista pelos art. 1.242 e 1.379 do Código Civil.
  • 10 anos (indígena): índio, integrado ou não, que ocupe como próprio, por 10 anos consecutivos, trecho de terra inferior a 50 hectares. Prevista no art. 33 da Lei 6.001/1973 (Estatuto do Índio).
  • 5 anos (ordinária habitacional ou pro labore): posse ininterrupta, de boa-fé e sem oposição, com justo título, se o imóvel tiver sido adquirido, onerosamente, com base no registro constante do respectivo cartório, cancelado posteriormente, desde que os possuidores nele tiverem estabelecido a sua moradia, ou realizado investimentos rurais de interesse social e econômico. Prevista no art. 1.242, parágrafo único, do Código Civil.
  • 5 anos (constitucional urbana): posse ininterrupta e sem oposição de área urbana de até 250m² para fins de sua moradia e sua família, desde que o possuidor não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. Prevista no art. 1.240 do Código Civil e no art. 183 da Constituição Federal.
  • 5 anos (constitucional rural): posse ininterrupta e sem oposição de área de terra em zona rural não superior a 50 hectares, tornando-a produtiva por seu trabalho ou de sua família, tendo nela sua moradia e desde que o possuidor não seja proprietário de outro imóvel urbano ou rural. Prevista no art. 1.239 do Código Civil e no art. 191 da Constituição Federal.

Para que possa realizar o procedimento de forma fácil e em conformidade com a legislação, o interessado deverá apresentar ao oficial de Registro de Imóveis um requerimento assistido por um advogado ou defensor público, instruído pelos seguintes documentos, em resumo:

  1. Requerimento assinado por advogado: deverá conter a identificação completa do requerente, a descrição do imóvel conforme a matrícula (ou a descrição da área caso o imóvel não possua matrícula); o tempo e as características da posse do requerente e de seus antecessores; a forma de aquisição da posse do imóvel usucapiendo com comprovação documental do tempo da posse; a modalidade de usucapião pretendida; o número de imóveis atingidos pela pretensão aquisitiva e a circunscrição; o valor do imóvel; que virá instruído com a procuração.
  2. Ata notarial, lavrada no cartório de Notas: a Ata será lavrada pelo tabelião de notas do município em que estiver localizado o imóvel usucapiendo ou a maior parte dele; será instruída com elementos comprobatórios, tais como fotos e documentos que permitam identificar o tempo de posse sobre o imóvel, depoimentos de testemunhas e das partes confrontantes; e outras informações que o tabelião de Notas considerar necessárias.
  3. Trabalhos técnicos: planta e o memorial descritivo assinados por profissional legalmente habilitado; descrição georreferenciada nas hipóteses previstas na Lei n° 10.267/2001, e nos decretos regulamentadores; a legislação dispensa em algumas situações a apresentação desses trabalhos.
  4. Justo Título: ou documentos que demonstrem a origem, continuidade, cadeia possessória e o tempo de posse; o justo título é obrigatório em algumas espécies de usucapião.
  5. Certidões negativas: certidões negativas dos distribuidores da Justiça Estadual e da Justiça Federal do local da situação do imóvel usucapiendo expedidas nos últimos trinta dias, demonstrando a inexistência de ações que caracterizem oposição à posse do imóvel, em nome das seguintes pessoas: a) do requerente e respectivo cônjuge ou companheiro, se houver; b) do proprietário do imóvel usucapiendo e respectivo cônjuge ou companheiro, se houver; c) de todos os demais possuidores e respectivos cônjuges ou companheiros, se houver, em caso de sucessão de posse, que é somada à do requerente para completar o período aquisitivo da usucapião;

Certidão dos órgãos municipais e/ou federais: para demonstrar a natureza urbana ou rural do imóvel usucapiendo, expedida até 30 dias antes do requerimento.

Por fim, após ingressar no Registro de Imóveis, caberá ao Registro de Imóvel a análise de toda a documentação, podendo solicitar novos documentos ou diligências “in loco”, para embasar juridicamente sua decisão, reconhecendo ou não o título ao requerente.

Vale a leitura do Roteiro para processamento de reconhecimento extrajudicial da Usucapião, que identifica a documentação que deverá ser apresentada para a análise do Registro de Imóveis, pois este texto apenas comenta sucintamente os requisitos normativos para o requerimento extrajudicial da usucapião.

Coluna publicada no Jornal de Notícias, na edição de 12 e 13 de outubro de 2019